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Trump usa desculpas econômicas para atacar o Brasil, e Bolsonaro é o maior prejudicado, afirma CEO da AZ Quest

Walter Maciel, CEO da AZ Quest.

Walter Maciel, CEO da AZ Quest.

Enquanto Donald Trump sobe cada vez mais a hostilidade contra o Brasil, em busca de desculpas econômicas para perseguir o país, o ex-presidente Jair Bolsonaro aparece como o maior prejudicado pela guerra comercial. Esta é a avaliação de Walter Maciel, CEO da AZ Quest, gestora independente que administra mais de R$ 36 bilhões em ativos.

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Em entrevista exclusiva ao Seu Dinheiro, Maciel afirmou que, ao tentar usar a "caça às bruxas" como discurso, Trump acaba colocando Bolsonaro em uma “loss-loss situation” — isto é, uma situação de “perda-que-ninguém-ganha”.

Isso porque, ao associar Bolsonaro como o responsável pela punição imposta pelos Estados Unidos, o ex-presidente é colocado na linha de frente de uma retaliação política, em um movimento que só prejudica sua imagem.

“Quando Trump reforça a ideia de que o processo contra Bolsonaro é politizado e injusto, ele coloca o ex-presidente no centro da crise. Porque o Bolsonaro passa a ser visto como o motivo de uma punição que os Estados Unidos impõem ao Brasil. Ele é o maior perdedor nesse caso”, afirmou Maciel.

Bolsonaro, que já responde a processos no Supremo Tribunal Federal (STF) por sua tentativa de golpe de Estado em 2022, foi alvo de uma operação da Polícia Federal (PF) na manhã desta sexta-feira (18), com mandados de busca e apreensão em sua residência. Agora, o ex-presidente passará a usar tornozeleira eletrônica e ficará sujeito a “medidas restritivas”.

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O timing da operação da PF não poderia ser mais significativo, já que ocorreu poucas horas após Trump ter enviado uma carta direta a Bolsonaro, afirmando que o governo brasileiro precisa mudar de rumo e parar de atacar oponentes

Trump decide misturar agressões à política do Brasil a retaliações comerciais 

Para o CEO da AZ Quest, esse cenário é um reflexo direto de uma escalada em que, ao tentar justificar suas atitudes com uma retórica econômica, Trump mistura agressões à política interna do Brasil — especialmente no que diz respeito a Bolsonaro — com retaliações comerciais externas.

“Parece que o governo Trump está buscando desculpas econômicas para uma atitude que tem motivação puramente política, e está disposto a usar esses instrumentos como ferramenta de pressão, já que não tem grandes preocupações com consequências econômicas e diplomáticas para os EUA. Porque não há muito o que o Brasil possa fazer.”

As tensões com os Estados Unidos esquentaram ainda mais esta semana, com o governo norte-americano abrindo uma investigação comercial contra o Brasil.

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Alegando práticas desleais que prejudicariam empresas norte-americanas, o governo Trump questiona pontos como o Pix, supostas tarifas preferenciais do Brasil para outros países e até mesmo a Rua 25 de Março. Você confere ponto a ponto as seis acusações dos EUA aqui.

O gestor afirma que os novos desdobramentos das tensões comerciais entre os EUA e o Brasil sinalizam que a situação ficou muito mais complicada para os brasileiros.

Para Maciel, o timing da escalada da hostilidade norte-americana indica uma elevação da hostilidade e da possível retaliação. Ao mesmo tempo, o Brasil perde poder de negociação, já que os EUA sinalizaram que as tensões poderiam escalar para motivos além do comércio.

“Sem dúvida, o grau de preocupação se elevou, e fica mais difícil para o governo brasileiro negociar com os EUA. Fica evidente que a motivação política de Trump agora começa a ser travestida de desculpas econômicas sobre problemas antigos e conhecidos.”

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Bolsonaro não é a única motivação de Trump na briga com o Brasil: Brics também influenciaram a hostilidade, diz gestor

Na visão de Maciel, o Brasil até então vinha sendo beneficiado pela sua “insignificância econômica e geopolítica”. 

Devido à neutralidade brasileira, o país podia fechar negócios com todo mundo. O Brasil ainda conseguiu se beneficiar da “maneira desastrada” que se iniciou o novo mandato do governo Trump, surfando a desvalorização da moeda norte-americana frente a outras divisas.

Porém, ao tentar desafiar a ordem econômica internacional, o Brasil pode ter gerado uma espécie de punição autoinfligida, segundo o gestor. “O Brasil estava gozando de uma trégua geopolítica, mas isso acabou.”

“A gente de alguma maneira provocou a reação norte-americana. Nós colocamos o dedo na tomada esperando não tomar choque, sendo que já sabíamos que os EUA estavam adotando uma certa agressividade frente a outros países”, afirmou o gestor. 

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“Quando você começa a falar à luz do dia sobre criar um novo mecanismo de transferência e de meios de pagamentos para fugir do dólar e a fazer duetos com outros países, como China e Rússia, você começa a querer se tornar relevante no ambiente global”, acrescentou, referindo-se ao anúncio dos países dos Brics de que buscariam alternativas à moeda norte-americana.

Na leitura de Maciel, foi justamente ao sair da histórica posição de neutralidade diplomática e comercial que o Brasil “levou uma porrada”.

“Acabamos adentrando searas muito delicadas. Com essas ações recentes, conseguimos sair de uma posição onde a gente recebia uma tarifa de 10% e estávamos em vantagem sobre a grande maioria dos países, para agora receber uma punição severa, em que é evidente que alguns setores vão ser afetados.”

Brasil deveria buscar menos retaliação e mais diplomacia

O CEO da AZ Quest também criticou a retórica tarifária do Brasil, em que o governo inicialmente sinalizou retaliações com base na lei da reciprocidade. Para Maciel, essa estratégia foi “inútil” e poderia trazer um saldo bem negativo ao país.

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“Você só acabava cutucando a onça com vara curta. Isso apenas expôs o Brasil a uma situação de vulnerabilidade em um momento onde nossa balança de pagamentos já está frágil. Tudo isso é muito ruim e é gratuito, porque não trouxe bem nenhum. Agora, a nossa única saída é por canais diplomáticos. O governo Lula deve insistir e tentar negociar, mostrando alinhamento com os EUA”, disse o CEO da AZ Quest.

No entanto, ele ressalta que isso não significa que o Brasil deva ceder à pressão política dos EUA. 

Em vez disso, o país deve deixar claro que as disputas internas precisam ser resolvidas dentro do âmbito jurídico e não devem ser usadas como justificativa para retaliações políticas externas.

Para o gestor, o Brasil deveria abrir um caminho de diálogo com o governo norte-americano. Lula deveria explicar que somos um país democrático, em que os poderes são independentes e onde não há muita coisa que o Executivo possa fazer para interferir em um julgamento que está sendo conduzido pelo Judiciário.

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Vale ressaltar que a conversa com Walter Maciel aconteceu antes de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter concedido uma entrevista à CNN norte-americana e feito um pronunciamento em rede nacional de rádio e TV

Bolsonaro, Lula e o saldo político da pressão de Donald Trump

Para Maciel, apesar da hostilidade dos EUA, as medidas de Trump não devem mudar o resultado dos julgamentos e investigações contra Bolsonaro. 

“Na minha opinião, o Bolsonaro é o maior perdedor de tudo isso. Nada disso vai ajudar o caso dele. O Supremo não vai deixar de julgá-lo e a consequência final do julgamento não vai mudar. A decisão não vai mudar por o Brasil ter medo dos Estados Unidos. Bolsonaro só vai acabar sendo apontado como vilão pela punição do Brasil”, avaliou.

Quanto a Lula, o gestor acredita que, embora o presidente tenha ganhado popularidade nas pesquisas recentes devido à postura mais firme frente aos EUA, isso não se traduzirá em ganhos duradouros a longo prazo. 

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Na realidade, segundo o CEO da AZ Quest, o efeito econômico negativo para Lula poderia ser “muito mais deletério” do que qualquer ganho político positivo até as eleições de 2026. 

Isso porque manter essa bandeira nacionalista viva até outubro do ano que vem exigiria um aumento na "briga" com os americanos, o que poderia gerar efeitos econômicos muito mais grosseiros, como uma inflação mais elevada e juros em patamares restritivos por mais tempo.

Quem sai ganhando?

Se alguém pode se beneficiar politicamente dessa situação toda, segundo Maciel, é o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.

“O maior beneficiário dessa confusão toda é o Tarcísio, que apareceu com uma postura um pouco mais estadista e com uma tentativa de abrir diálogo diplomático. Isso distancia ele dos dois lados mais radicais e pode fortalecer sua posição política”, afirmou o executivo.

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