Enquanto algumas empresas da bolsa enfrentam uma tempestade perfeita, a Aura Minerals (AURA33) parece viver um alinhamento de astros. Desde a listagem na Nasdaq em 16 de julho, a mineradora de ouro viu liquidez aumentar, ações se valorizarem e o dividend yield (retorno em dividendos) se manter robusto nos últimos 12 meses, somado a planos de expansão para ampliar a receita nos próximos quatro anos.
Com 67% da receita exposta ao ouro e 33% ao cobre, a empresa era listada em Toronto, mas a liquidez dos BDRs (recibos de ações) negociados na B3 desde 2020 era limitada. O CEO, Rodrigo Barbosa, lembra que os BDRs já chegaram a negociar cerca de US$ 2 milhões por dia, o suficiente para as pessoas físicas, mas insuficiente para investidores institucionais.
“Investidor pessoa física precisava de no máximo US$ 100 mil de liquidez, mas grandes fundos não fazem investimento por menos de US$ 20 milhões”, explicou Barbosa em entrevista ao Seu Dinheiro.
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Estudos de grandes bancos mostraram a Barbosa que seria necessário atingir pelo menos US$ 10 milhões diários em todas as bolsas para atrair investidores globais. Assim, a Aura Minerals fez IPO (abertura de capital) nos EUA, captando US$ 196 milhões na Nasdaq, com o código AUGO.
A mineradora decidiu ainda cancelar a listagem na bolsa canadense TSX (código ORA), concentrando negociações nos EUA, para elevar a liquidez. Desde 5 de setembro, os BDRs AURA33 já são lastreados nas ações da Nasdaq.
Os resultados apareceram rápido: quase 60 dias após o IPO na Nasdaq, a liquidez da Aura atingiu US$ 17,25 milhões por dia, bem acima das expectativas do mercado que esperava que a companhia alcançasse uma liquidez de US$ 15 milhões nos próximos 12 meses.
Segundo a empresa, isso favorece a entrada de fundos globais e a valorização das ações e BDRs AURA33 no médio e longo prazo. Nos dividendos, outros fatores influenciam. Com a meta de liquidez batida antecipadamente, a perspectiva do CEO da Aura Minerals é que a companhia permaneça em um patamar de liquidez diária entre U$S 15 milhões e US$ 20 milhões nos próximos 12 meses.
Barbosa conta que, antes da listagem nos EUA, havia pouco mais de três grandes fundos na base acionária, mas saltaram para quase 30, incluindo tradicionais investidores de ouro como a família Lundin. A companhia ainda deve revelar mais detalhes desses fundos nas próximas semanas.
Dados da B3 mostram 53 investidores institucionais na base da mineradora. O mercado projeta que a liquidez chegue a US$ 15 milhões nos próximos 12 meses. O CEO concorda.
Para o investidor pessoa física, maior liquidez traz mais visibilidade e tende a reduzir o desconto histórico da ação. Analistas projetam valorização adicional, e o Santander já estima salto de 30% nos preços dos ativos. Até 5 de setembro, AURA33 acumulava alta de 138,55% no ano, bem acima dos retornos anteriores na B3.
Parte do mercado vê fundamentos e projetos de expansão ainda não precificados, enquanto outros recomendam cautela, destacando que o ponto de entrada na ação pode estar ficando para trás.
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Acompanhando a alta do ouro
Embora bastante exposta ao ouro, a receita da Aura Minerals não depende apenas da commodity. Ainda assim, o preço do metal tem sido determinante para dividendos e valorização dos papéis nos últimos anos.
Quanto maior a cotação, maiores os proventos. Nos últimos três anos, a valorização do papel também acompanhou esse fluxo da commodity. Veja no levantamento a seguir:
Evolução AURA33 vs. ouro
Ano | Dividendos por ação | Dividend yield (retorno em dividendos) | Valorização da ação | Preço médio do ouro |
---|---|---|---|---|
2020 | R$ 0 | 0% | 18,28% | US$ 1.774,35 |
2021 | R$ 2,18 | 10,79% | -17,15% | US$ 1.798,72 |
2022 | R$ 0,48 | 3,18% | -30,35% | US$ 1.801,90 |
2023 | R$ 0,63 | 6,34% | 23,33% | US$ 1.947,24 |
2024 | R$ 1,07 | 9,15% | 126,95% | US$ 2.392,76 |
2025* | R$ 1,93 | 9,13% | 127,80% | US$ 3.216,30 (acumulado do ano) |
*Dados de dividendos em 2025 consideram os últimos 12 meses até 18 de setembro, valorização e preço do ouro no acumulado do ano
Atualmente acima de US$ 3.600 por onça-troy (e tendo chegado a bater US$ 3.700 recentemente), o ouro segue em tendência de alta diante do corte recente de juros americanos feito pelo Federal Reserve, para o intervalo de 4% a 4,25%. Com a sinalização de mais dois cortes até o final do ano, o ouro pode se beneficiar.
“Historicamente com juros mais baixos o ouro se valoriza pela incerteza. Não dá para cravar que continue subindo, mas deve se manter no patamar elevado atual”, afirma Fabiano Vaz, sócio e analista da Nord Research.
Outros analistas são mais otimistas. Marco Saravalle, estrategista-chefe da MSX Invest, projeta US$ 4 mil por onça nos próximos 6 a 12 meses. O Goldman Sachs vê espaço para US$ 4 mil até meados de 2026, podendo se aproximar de US$ 5 mil caso a credibilidade do Fed seja abalada.
Ouro a US$ 6 mil a onça?
Essa visão é partilhada pelo CEO da Aura Minerals, que também acredita nas projeções de US$ 4 mil para o preço do ouro nos próximos meses. Barbosa defende que outros fatores impulsionam a alta da commodity além do corte de juros do Fed. Ele cita a guerra entre Rússia e Ucrânia, que levou ao confisco das reservas dolarizadas da Rússia e estimulou países e bancos centrais, como a China, a ampliar a compra de ouro.
“Tem nações comprando mais ouro e menos dólar, e a expectativa desse movimento ser reversível é baixa”, afirma.
O executivo também destaca o déficit fiscal de países desenvolvidos como Alemanha, França, Inglaterra e EUA, entre outros, que gastam mais do que arrecadam e podem enfrentar dificuldade de honrar dívidas no futuro, diante da queda da natalidade.
“Eles estão imprimindo dinheiro, e as moedas se desvalorizando. Então o ouro valorizou muito porque o investimento em juros desses países é uma má estratégia. Historicamente o que preserva valor é investir em ouro, e não tem como imprimir o metal”, justifica Barbosa.
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Para ele, uma eventual política fiscal mais austera poderia influenciar negativamente o preço do ouro no curto prazo, mas não há esse debate hoje. Barbosa não considera exagero que o ouro chegue a US$ 6 mil no longo prazo, desde que esses fatores se mantenham. Analistas, porém, são céticos em relação a esse patamar.
Para a Aura, preços mais altos do ouro significam dividendos maiores. “O preço do ouro aumenta, gera crescimento de receita, mais margens de lucro e consequentemente mais dividendos”, observa Max Bohm, estrategista de ações da Nomos.
O CEO da Aura Minerals confirma que a companhia costuma pagar acima da política formal de dividendos quando há forte geração de caixa, diante da alta da commodity.
Pela sua política de remuneração, a empresa distribui 20% do Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) menos o capex (investimentos) recorrente. As distribuições são trimestrais, em fevereiro, maio, agosto e novembro.
Segundo o CEO, o endividamento é controlado, e os projetos em andamento não devem comprometer a geração de caixa, o que favorece a lucratividade e os proventos. Hoje, a companhia precisa do ouro negociando acima de US$ 1.500 para cobrir custos.
Projetos em expansão e receita
Vaz, da Nord, destaca que a Aura Minerals combina planos de expansão robustos com eficiência de custos e crescimento de produção, o que reduz a dependência da commodity e ajuda a atravessar períodos de queda no ouro. “Enquanto outras mineradoras sofrem mais com a correção da commodity, a Aura consegue aumentar a produção e minimizar esse impacto nos resultados”, diz.
A meta de médio prazo da Aura é chegar a 450 mil onças de produção, ainda sem data definida. Para 2025, o objetivo é fechar o ano entre 266 mil e 330 mil onças, acima do atual patamar de 250 mil.
Barbosa explica que a declaração comercial de Borborema (RN) deve ocorrer em breve, com contribuição parcial à receita já no quarto trimestre e total a partir de 2026. A produção média esperada é de 83 mil onças anuais.
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Outro projeto é Serra Grande (GO), adquirido da AngloGold, com produção de cerca de 80 mil onças. A Aura prevê de seis a 12 meses de ajustes, produzindo abaixo desse patamar, para recuperar a eficiência operacional e, no segundo semestre de 2026, retomar níveis adequados.
Também estão no radar Era Dourada (Guatemala), com capacidade para 90 mil onças por ano, e Matupá (MT), ambos ainda em fase de construção. Segundo o CEO, o primeiro tem prazo estimado de dois anos, e o segundo de um ano e meio, o que deve gerar novas receitas a partir de 2028. Há ainda Serra da Estrela (Carajás), depósito de cobre em estudo, cujo prazo de desenvolvimento seria de três a quatro anos.
Barbosa observa que muitos analistas ainda não consideram em seus cálculos o potencial de Era Dourada e Matupá, levando em conta apenas Borborema e Serra Grande. “Entendemos que o preço-alvo que eles dão às ações e BDRs pode ser aumentado à medida que desenvolvamos esses novos projetos”, afirma o CEO.
Aura Minerals é uma tese de valor ou de dividendos?
Aura Minerals já viveu diferentes fases: de ignorada pelo mercado a destaque pela forte geração de caixa e política de dividendos recorrentes. Hoje, com ações em forte alta, a dúvida é se ainda vale a entrada, seja pela valorização ou pela renda passiva. Afinal, com a alta das ações, o dividend yield (retorno em dividendos) também pode diminuir.
Rodrigo Barbosa afirma que a política de proventos segue sem alterações nos próximos anos, com pagamentos trimestrais, mas não há espaço para novas distribuições extraordinárias como a de 2021, quando a empresa pagou R$ 2,18 e alcançou dividend yield de 10,79%. “Somos uma empresa que já demonstrou que consegue crescer de forma acelerada sem comprometer um dividendo interessante”, diz o CEO.
Para Saravalle, da MSX, a tese hoje é, principalmente, ganho de capital, impulsionada pelos projetos de expansão e pela valorização do ouro, além de uma forma de diversificar e proteger a carteira. O analista projeta AURA33 em R$ 60, mas pretende reajustar seu preço-alvo para cima.
Em relação aos dividendos, Saravalle está muito otimista e acredita que o lucro líquido vai explodir em 2026 diante da alta do ouro, levando o dividend yield do próximo ano para 11,5%. Já para os próximos 12 meses, o patamar é mais contido, com retorno em dividendos esperado de 7,1%.
Vaz, da Nord, acredita que a ação se tornou mais uma estratégia de valor do que de dividendos, já que há opções mais atrativas de proventos, e a tributação de 30% na fonte sobre dividendos de BDRs pesa. Mas reforça que o desconto do papel se reduziu. “O investidor precisa tomar cuidado com o preço de compra. Aura se tornou mais uma ação de estratégia de valor”, avalia.
Ainda assim, Vaz reconhece que o plano da empresa é sólido para o longo prazo, com crescimento consistente e capacidade de execução, apesar da dependência do preço do ouro. Ele espera dividendos modestos, com um yield de 4%.
Já Bohm, da Nomos, acredita que AURA33 segue servindo para as duas estratégias. Ele vê espaço para valorização até R$ 70 e dividend yield projetado entre 7% e 8%, acima da média da bolsa, de 6%. “Ainda está descontada e negociando abaixo dos múltiplos de mineradoras de ouro internacionais, com espaço para valorização de até 25%”, afirma.
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BDR ou stock?
Os analistas avaliam que tanto o BDR AURA33 quanto a ação AUGO na Nasdaq podem ser interessantes para se ter em carteira.
Vaz ressalta que depende do perfil do investidor. Para quem já dolariza a carteira investindo nos EUA talvez seja mais oportuno comprar diretamente a ação lá fora e cancelar os BDRs. Atualmente, 1 ação AUGO é equivalente a 3 BDRs AURA33 na bolsa brasileira.