Reuniões de organismos multilaterais costumam terminar junto com a divulgação de uma declaração conjunta. No entanto, a reunião de ministros das finanças e presidentes de bancos centrais do G20 presidida pelo Brasil terminou na quinta-feira (29) em São Paulo sem um comunicado conjunto.
O motivo foi a falta de consenso sobre questões geopolíticas, que envolve os conflitos na Ucrânia e na Faixa de Gaza.
"Havíamos nutrido a esperança de que temas mais sensíveis como geopolítica fossem debatidos no encontro de chanceleres", disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
No entanto, na reunião realizada no Rio de Janeiro na semana passada, não houve consenso.
G20 acaba sem 'communiqué'
O chamado communiqué, muito usado em tratativas internacionais, é publicado ao final de eventos multilaterais e tem o objetivo de explicitar consensos entre os países que participam dos encontros.
Haddad disse que a reunião do G20 chegou a um consenso nos temas financeiros.
Com dois pilares da tributação internacional, construídos na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a serem concluídos até o fim do ano, Haddad disse que o Brasil tomou a iniciativa de colocar em debate um terceiro: a fixação de uma alíquota mínima sobre a riqueza mundial.
"Temos condição de buscar maior justiça tributária no mundo."
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A palavra da discórdia
A divergência em torno de uma palavra não permitiu que a reunião de autoridades monetárias de todo o mundo terminasse com um comunicado conjunto do G20.
Segundo apurou a reportagem, o impasse ocorreu no trecho "war on Ukraine" (guerra contra a Ucrânia) ou "war in Ukraine" (guerra na Ucrânia).
A Rússia defendia a última expressão enquanto os países mais ricos ocidentais do bloco brigaram pela primeira.
As economias mais desenvolvidas também não queriam mencionar Israel no conflito com o Hamas, e defendiam que houvesse uma citação apenas à crise em Gaza.
"Chegou uma hora em que o impasse era tão pequeno que dizia respeito a uma palavra", afirmou o ministro, que não revelou qual era o termo.
No entanto, reconheceu Haddad, "chega uma hora que a reunião termina". Haddad não citou quem estava irredutível.
Publicamente, o ministro das Finanças da Alemanha, Christian Lindner, declarou mais de uma vez que o país não assinaria o comunicado se não houvesse citação às guerras na Faixa de Gaza e na Ucrânia.
Em setembro do ano passado, antes do agravamento do conflito em Gaza, líderes do G20 reunidos na Índia condenaram a guerra na Ucrânia, mas sem citar a Rússia.
Tensão geopolítica permeou debates no G20
O diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, Paulo Picchetti, comentou que as tensões geopolíticas em todo o mundo têm desdobramentos sobre o lado financeiro e econômico.
Há ainda os riscos climáticos, lembrou ele, que já provocam efeitos na oferta de curto prazo em diferentes regiões do planeta.
"Já existem evidências de que o clima tem impacto sobre expectativas e preços, que em última análise estão afetando o balanço total de risco", disse o diretor do BC em conversa com jornalistas durante o G20, em São Paulo.
"Há riscos pelo momento em que o mundo vive, o que envolve questões de tensões geopolíticas", afirmou o executivo da autoridade monetária.
Perguntado sobre as discussões para descongelar ativos russos e levar os recursos para a Ucrânia, como querem os Estados Unidos, Picchetti disse que o tema não foi tratado nas reuniões plenárias.
Já o tema guerra - entre Rússia e Ucrânia e de Israel com o Hamas - apareceu durante os debates.
Sobre os pagamentos transfronteiriços, Picchetti disse que teve muitas conversas sobre questões econômicas e tecnológicas para permitir que se transformem em realidade.