Pelo menos por hoje, o dragão da inflação foi engolido pelo Leão da Receita Federal. A preocupação com a alta dos preços em escala global até ditou o ritmo dos mercados nas primeiras horas do dia, mas foi só a equipe econômica entrar em campo para o jogo mudar.
Perto do aniversário de um ano do envio da primeira fase da reforma tributária ao Congresso (e que ainda se encontra em discussão), o ministro da Economia Paulo Guedes apresentou a sua proposta de alterações no imposto de renda para pessoa física, jurídica e investimentos, mexendo em um tema ‘caro’ aos investidores - a tributação de dividendos.
A proposta aumenta o limite de isenção para aqueles que recebem até R$ 2,5 mil e passa a tributar dividendos recebidos pela pessoa física em 20% na fonte. Para compensar a mudança, o projeto também reduz a alíquota do IRPJ em cinco pontos percentuais.O mercado não gostou.
Após a apresentação do projeto, a bolsa renovou seguidas vezes a mínima do dia, chegando a recuar mais de 2%. Nicolas Borsoi, economista da Nova Futura Investimentos, aponta que tanto o fim da isenção para proventos como também para aplicações em fundos imobiliários acaba reduzindo a atratividade desses investimentos para a pessoa física.
No fim do dia, a pressão foi minimizada e o Ibovespa fechou a sessão em queda de 1,74%, aos 127.255 pontos. O maior “empurrão” veio principalmente do setor bancário, que tradicionalmente é um bom pagador de proventos. O desempenho do índice nesta sexta-feira apagou os ganhos da semana e fez a bolsa recuar 0,90% no período.
Freio na descida
No dólar à vista, outro fator estressor vindo de Brasília fez com que a moeda devolvesse parte do forte recuo da semana: a CPI da covid escuta hoje o deputado Luis Miranda, que acusa o governo federal de irregularidades na compra das vacinas Covaxin.
Na busca por proteção e antecipando problemas para o governo Bolsonaro, os investidores se voltaram para o dólar, que fechou o dia em queda de 0,67%, a R$ 4,9377. Ainda assim, a divisa conseguiu preservar o recém-conquistado patamar dos R$ 4,90, acumulando uma queda de 2,58% na semana.
Para Alexandre Almeida, economista da CM Capital, a perspectiva de juros mais elevados no país tem sustentado o bom fluxo de investimentos estrangeiros no Brasil, sustentando o alívio no câmbio.
Leão mais voraz?
Pela manhã, o ministro da Economia Paulo Guedes entregou ao presidente da Câmara, Arthur Lira a 2ª parte da proposta tributária do governo. O texto trata de mudanças no imposto de renda para pessoa física, jurídica e investimentos. Confira aqui os principais pontos da proposta.
Segundo a Receita, a tributação de dividendos deve aumentar a arrecadação em R$ 54,9 bilhões em 2023 e R$ 58,1 bi em 2024. Já a redução da alíquota do IRPJ reduz o montante arrecado em R$ 18 bi.
Embora a proposta tenha azedado o humor dos investidores, é bom lembrar que o assunto ainda está em fase inicial de discussão. Para Rafael Passos, sócio da Ajax Capital, ainda é preciso esperar os próximos meses para tirar uma conclusão mais assertiva. Para Passos, a reforma tributária ainda tem muito chão para andar, mas a aproximação entre Congresso e a equipe econômica é uma articulação muito positiva para o mercado.
Borsoi, da Nova Futura, aponta que essa demora e prolongamento das discussões gera mais incertezas. O caráter amplo do texto também é motivo de preocupação. “O investidor quer fugir da incerteza e essa proposta é bastante ampla, bastante conflituosa. Abre espaço para debate, então é natural que o investidor queira esperar a negociação no Congresso e se desfazer das posições”.
Para o economista da CM Capital, o tema deve exercer apenas uma pressão de curto prazo nos negócios. Nas próximas semanas, os agentes financeiros devem voltar a focar na trajetória das taxas de juros ao redor do globo para conter a inflação.
Pressionando para baixo
O setor financeiro, tradicionalmente um segmento com bom histórico de pagamento de dividendos, pressionou para baixo o Ibovespa, com os principais bancos do país registrando perdas na casa dos 3%. Vale lembrar que nesta semana também tivemos a aprovação do aumento da CSLL, o que também pesou sobre os papéis nos últimos dias.
A Petrobras também exerceu uma pressão negativa no índice hoje, mesmo com a alta do petróleo no cenário internacional — a commodity subiu antecipando a reunião da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+). Rumores apontam que a entidade pode aumentar a oferta a partir de agosto.
No caso da petroleira brasileira, o depoimento do CEO da companhia, general Joaquim Silva e Luna, gerou estresse, ainda que o comandante da estatal pouco tenha falado ao longo de três horas na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados.
No rastro do dragão
A Super Quarta foi na semana passada, mas os últimos dias continuaram sendo dominados pelo mercado de juros e o temor da futura postura dos Bancos Centrais para conter uma pressão inflacionária.
Nesta sexta-feira (25), o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), considerado a prévia da inflação, veio em linha com o esperado e acelerou 0,83% em junho, acumulando uma alta de 8,13% em 12 meses. Se não fosse a tensão envolvendo o Leão, o provável é que o número fosse recebido com mais otimismo com o mercado, que vem reduzindo suas expectativas para a Selic após o tom mais ameno do BC brasileiro na divulgação do Relatório Trimestral de Inflação (RTI) ontem (24).
Esse tom mais brando - que deflagrou um movimento de queda nos principais contratos de DI - veio apenas dois dias depois da divulgação da ata da última reunião do Copom. No documento, o Banco Central mostrou uma postura mais dura, que fez boa parte do mercado aumentar a aposta para a alta da Selic.
Por isso, os últimos dias foram de ajustes. Para a CM Capital, no entanto, nada mudou, e a casa segue com uma expectativa de alta de cem pontos base na reunião de agosto. No radar está o possível reajuste dos combustíveis e da tarifa de energia elétrica, que devem pressionar os índices de inflação. Nas reuniões subsequentes, no entanto, o esperado é que o BC já observe um arrefecimento inflacionário e aposte em uma redução do ritmo de alta até chegar aos 7% ao fim de 2021
O dia começou com alívio no mercado de juros, mas a deterioração do cenário local após a divulgação da proposta de Guedes reduziu o ritmo de queda dos DIs mais curtos, com os vencimentos mais longos operando em alta. Confira as taxas de fechamento:
- Janeiro/22: de 5,72% para 5,66%
- Janeiro/23: de 7,22% para 7,14%
- Janeiro/25: de 8,15% para 8,16%
- Janeiro/27: de 8,53% para 8,58%
Tecla SAP
A preocupação com a inflação americana também segue sendo o principal motor das bolsas americanas. Hoje a atenção ficou com os dados de gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês), o indicador utilizado pelo Federal Reserve na análise de cenário macroeconômico.
A alta foi de 0,4% em maio ante abril, com o núcleo do PCE avançando 0,5%, ambos abaixo da expectativa dos analistas. O número que salta aos olhos é o acumulado em 12 meses, que subiu a 3,9%, bem acima da meta de 2% ao ano do Fed.
Com isso, a bolsa americana teve um dia calmo. O Dow Jones subiu 0,69% e o S&P 500 teve um novo recorde de fechamento com uma alta de 0,33%. A exceção foi o Nasdaq, com um recuo de 0,06%.
Nos últimos dias, no entanto, essa não foi a tônica dos negócios. Preocupados com os próximos passos do Fed e ainda tentando entender os sinais mistos da economia americana, os agentes financeiros tendem a reagir exageradamente a cada novo pronunciamento de um dirigente do Fed.
Pelos próximos meses, além do olho no BC americano, os investidores também devem ficar de olho no Senado. O acordo bipartidário para o pacote de infraestrutura do governo Biden chegou, mas o tema está longe de ser esgotado.
O plano de infraestrutura de US$ 1,2 trilhão ainda não está em sua forma final. As negociações continuam no Senado, onde pode existir resistência dos próprios democratas, que apoiam um montante maior. O valor será financiado com o reaproveitamento de fundos federais não utilizados no combate à pandemia, parcerias público-privadas e a elevação de impostos já anunciados pelo governo.
Dias melhores
Com CPI da covid, denúncias de corrupção e projeto de tributação polêmico, Brasília já viveu dias melhores — e nem faz tanto tempo assim.
Na segunda-feira (21), a MP da privatização da Eletrobras finalmente teve a sua etapa final e foi mais uma vez apreciada na Câmara após as alterações feitas no Senado. Segundo o cronograma do governo, a capitalização deve ser concluída até fevereiro de 2022.
Sobe e desce
A alta das empresas ligadas ao minério de ferro foi expressiva nos últimos dias, deixando o setor no topo da tabela de melhores desempenho da semana.
De olho na recuperação econômica e a reabertura com o andamento do processo de vacinação, os papéis da CVC também se destacam.Confira:
CÓDIGO | NOME | ULT | VARSEM |
BRAP4 | Bradespar PN | R$ 73,07 | 9,08% |
CVCB3 | CVC ON | R$ 27,65 | 6,96% |
GGBR4 | Gerdau PN | R$ 30,84 | 6,05% |
CSNA3 | CSN ON | R$ 43,55 | 5,19% |
VALE3 | Vale ON | R$ 112,40 | 5,06% |
Confira as ações com os piores desempenhos da semana:
CÓDIGO | NOME | VALOR | VARSEM |
ABEV3 | Ambev ON | R$ 16,95 | -9,65% |
ECOR3 | Ecorodovias ON | R$ 11,88 | -7,62% |
TIMS3 | Tim ON | R$ 11,77 | -7,47% |
MULT3 | Multiplan ON | R$ 24,04 | -6,68% |
CIEL3 | Cielo ON | R$ 3,67 | -6,62% |