O ministro da Economia, Paulo Guedes, apostou alto ao acusar a ocorrência de uma “debandada” em sua equipe na tentativa de puxar a brasa para sua sardinha e fazer com que o presidente Jair Bolsonaro apoiasse com mais vigor e explicitude sua agenda liberal de Estado mínimo, obediência ao teto de gastos e privatizações.
Mas Bolsonaro reagiu com um apoio considerado protocolar e agentes do mercado financeiro seguem em dúvida se o presidente vai ou não dobrar a aposta em uma agenda mais popular depois do truco do ministro.
O mau humor externo em nada ajudou. Os índices Dow Jones e S&P-500 fecharam em queda, assim como as bolsas europeias e o petróleo. Sem força para remar contra a corrente, o Ibovespa acabou amplificando a queda após uma tentativa de recuperação pela manhã e recuou 1,62%, fechando a 100.460,60 pontos. O dólar, por sua vez, fechou em queda em um movimento de correção à forte alta de ontem.
Defesa protocolar
Em um pronunciamento breve e sem muitos detalhes proferido na noite de ontem, o presidente Jair Bolsonaro declarou-se “comprometido” com o teto de gastos e o ajuste fiscal.
Ele estava acompanhado dos presidentes da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM/RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM/AP).
Tanto Maia quanto Alcolumbre fizeram declarações no mesmo tom daquele de Bolsonaro. E a sugestão de que Legislativo e Executivo estariam na mesma sintonia com relação aos temas intensificou a sensação de alívio entre os investidores nas primeiras horas de sessão.
Entretanto, a tímida defesa de Bolsonaro àquele que é considerado seu mais poderoso ministro foi vista como "curta e protocolar", conforme resumiu o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira, em comentário sobre a fala presidencial.
Cartas na mesa
Comparando a declaração feita anteontem por Guedes a uma jogada de pôquer, o analista Jefferson Lima, da CM Capital Markets, observou mais cedo que o ministro "ganhou fichas, ou melhor, raspou a mesa e voltou" ao jogo.
“Porém, a mesa continua cheia e os participantes com o intuito de furar o teto seguem no jogo, mas com menos fichas”, prosseguiu.
A partir do meio da tarde, a percepção de que a "debandada" enfraqueceu a agenda ultraliberal de Paulo Guedes ganhou corpo entre os investidores.
Na véspera, os temores com a fala do próprio ministro sobre uma "debandada" em sua equipe já haviam pesado sobre os ativos brasileiros ao longo de quase toda a sessão.
Responsabilidade fiscal ou popularidade?
O entendimento entre alguns analistas é de que Bolsonaro, ao ser desafiado por Guedes, terá que fazer em breve uma escolha entre a agenda do ministro e sua popularidade com vistas à reeleição.
Mas nem tudo era vermelho na telinha do Ibovespa. No lado positivo, a bolsa contou com os bons resultados trimestrais de empresas como a Via Varejo, o que contribuiu para colocar ações do segmento varejista em alta.
No campo dos indicadores, sinais de recuperação no mercado de trabalho norte-americano e no setor de serviços brasileiro em junho deram alguma sustentação à B3 pela manhã.
Entretanto, em um dia pouco favorável ao risco no exterior, com o petróleo em baixa, desempenho sem direção única nos índices de ações em Nova York e negativo nos fechamentos da Europa, o Ibovespa firmou-se em queda no meio da tarde.
Confira quais foram as maiores altas e quedas do dia entre os componentes do Ibovespa.
MAIORES ALTAS
- Via Varejo ON (VVAR3) +3,41%
- Klabin Unit (KLBN11) +2,98%
- Hapvida ON (HAPV3) +2,12%
- Natura ON (NTCO3) +1,97%
- B2W ON (BTOW3) +1,45%
MAIORES QUEDAS
- BRF ON (BRFS3) -7,80%
- BR Malls ON (BRML3) -7,74%
- Eletrobras ON (ELET3) -6,94%
- Multiplan ON (MULT3) -5,94%
- Eletrobras PN (ELET6) -5,38%
Dólar e juro
O dólar, por sua vez, manteve-se em queda desde o início da sessão. A moeda norte-americana passou por um ajuste depois da forte alta da véspera, quando o estresse nos mercado de câmbio levou o Banco Central a intervir duas vezes com o objetivo de frear a desvalorização do real.
A queda do dólar chegou a perder um pouco de força no meio da tarde desta quinta-feira com o aumento da aversão ao risco no exterior, mas não houve reversão no cenário. A moeda norte-americana fechou em queda de 1,53%, cotada a R$ 5,3677.
Apesar da queda do dólar, os contratos de juros futuros, que costumam acompanhar a taxa de câmbio, desgarraram-se para fechar em alta com base nos temores de que o alívio fiscal tenha curta duração em meio à falta de gatilhos de curto prazo para uma queda nas taxas.
Confira as taxas negociadas de alguns dos principais contratos negociados na B3:
- Janeiro/2021: de 1,880% para 1,890%;
- Janeiro/2022: de 2,770% para 2,810%;
- Janeiro/2023: de 3,950% para 4,000%;
- Janeiro/2025: de 5,710% para 5,840%.