As apostas esportivas online cresceram no Brasil e, junto delas, um modelo de marketing de influência que movimenta cifras milionárias: youtubers, streamers e criadores de conteúdo promovem casas de apostas, direcionando novos clientes para plataformas digitais.
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Mas por trás das promessas de ganhos rápidos, há uma prática pouco conhecida do público: a chamada “cláusula da desgraça”.
Como funciona a “cláusula da desgraça”
Em linhas gerais, funciona como um modelo de comissão atrelado às perdas dos apostadores. Ou seja, o influenciador não recebe um pagamento fixo apenas por divulgar a plataforma — ele recebe uma porcentagem do valor que seus seguidores perdem ao apostar.
Na prática, se um seguidor aposta R$ 100 e perde, uma parte desse valor vai para o influenciador como comissão.
Quanto mais o público apostar e perder, maior o ganho do criador de conteúdo. Isso cria um incentivo direto para que o influencer atraia mais apostadores, sem se preocupar com os resultados das apostas — o lucro dele não depende de acertos do público, mas da continuidade das perdas.
O efeito é duplo. Para a casa de apostas, é um incentivo para atrair novos clientes. Para o influencer, um negócio rentável que não depende do sucesso do seguidor, mas da continuidade das perdas.
Para o público, a conta é pesada: o modelo estimula apostas recorrentes e aumenta o risco de prejuízos financeiros significativos.
O resultado é um ciclo lucrativo para as plataformas e para os influenciadores, mas desastroso para quem aposta.
CPI das Bets
O esquema foi revelado por uma reportagem da revista piauí, publicada em janeiro.
Segundo a matéria, Virginia Fonseca teria um contrato com a Esporte da Sorte que garante a ela um pagamento adicional de 30% do valor perdido pelos usuários em apostas.
Durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Bets, que investiga a atuação de empresas de apostas online no país, Virgínia negou que seus contratos contivessem uma “cláusula da desgraça”.
Ela afirmou, porém, que receberia um bônus de 30% caso “dobrasse o lucro” da plataforma, sem detalhar os critérios, e disse nunca ter recebido o valor.
No debate parlamentar, a expressão “cachê da desgraça alheia” passou a ser usada para definir o modelo de remuneração que vincula os ganhos dos influenciadores às perdas dos apostadores.
O debate regulatório
Especialistas e membros da CPI destacam que, embora modelos de comissão baseados em perdas sejam comuns em alguns mercados regulamentados, no Brasil eles levantam questões éticas e legais.
A senadora Soraya Thronicke, relatora da CPI, afirmou que esse tipo de cláusula caracteriza conflito de interesse, ao ligar o lucro do influenciador às perdas de seus seguidores.
No entanto, seu parecer foi rejeitado por 4 votos a 3, encerrando a comissão de inquérito criada para investigar irregularidades e crimes no setor de apostas online.
Apesar disso, o modelo de negócios continua movimentando milhões — às custas das perdas dos usuários.