Ao anunciar a venda de um imóvel em Campo Grande (RJ), o fundo imobiliário Renda Corporativa Angico (ANGC11) reacendeu o debate sobre a segurança jurídica dos FIIs de tijolo, ou seja, que investem em imóveis físicos.
Isso porque o ANGC11 foi abordado por um corretor local, que apresentou um comprador interessado na aquisição do ativo: a Prefeitura do Rio de Janeiro. Seguida de uma vistoria, veio a publicação no Diário Oficial: Eduardo Paes, prefeito da cidade, definiu a área como de utilidade pública, visando uma possível desapropriação futura do imóvel.
A publicação estabelece que o espaço seja destinado à implantação do Super Centro Carioca de Saúde da Zona Oeste.
Segundo fato relevante enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) pelo FII, uma assessoria jurídica especializada foi acionada para avaliar os desdobramentos legais e operacionais decorrentes do decreto, bem como os próximos passos a serem adotados pelo ANGC11.
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Riscos subestimados?
Especialistas ouvidos pelo Money Times afirmam que o episódio não inaugura um novo precedente jurídico, já que o poder público possui prerrogativa constitucional para desapropriar bens privados por necessidade ou utilidade pública.
No entanto, quando atinge um fundo imobiliário, veículo coletivo de investimento com cotas pulverizadas entre investidores, o caso ganha maior visibilidade e acende um alerta no mercado para riscos pouco considerados.
“Embora não haja efeito vinculante para novos episódios, o fato pode sim influenciar decisões futuras, seja de entes públicos ao avaliarem imóveis como alvos potenciais, seja de investidores na precificação de ativos com maior exposição à intervenção estatal”, explica Daniel Blanck, advogado especialista em direito imobiliário, em entrevista ao Money Times.
De acordo com ele, FIIs que investem em áreas sujeitas a planos urbanísticos mais intervencionistas podem passar a ser vistos com maior cautela.
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Venda a mercado x desapropriação: qual a diferença?
Além da percepção de insegurança jurídica, os especialistas alertam para a diferença entre o valor obtido em uma venda negociada no mercado e aquele pago pelo poder público.
Segundo eles, em geral, o preço em uma desapropriação tende a ser inferior ao de uma negociação privada por diversos motivos.
“Isso ocorre porque a avaliação feita pelo poder público tende a ser conservadora, pautada por critérios técnicos e tabelas de referência que não consideram o potencial de valorização futura, ganhos indiretos ou elementos subjetivos como localização estratégica para o portfólio de um FII”, diz Blanck.
Ainda assim, ele destaca que a Constituição exige indenização “justa e prévia”, o que abre espaço para disputas judiciais quando o preço proposto não reflete o real valor de mercado do imóvel.
Gestão pode mitigar riscos
Já Thomaz Henrique Monteiro, sócio do HRSA Sociedade de Advogados, explica que existe margem para contestação e discussão do montante a ser indenizado.
Ele ressalta que a gestão pode solicitar certidões específicas que indiquem se o imóvel está em zona de interesse público ou já foi afetado por algum decreto de utilidade pública ou de interesse social, além de verificar a existência de ações judiciais em curso.
“Isso aumenta a segurança no momento da aquisição, mas não impede que, futuramente, a área seja incluída em novo decreto”, afirma.