Ainda que a eleição presidencial não tenha sido definida na noite de domingo (2), uma certeza já agrada o mercado financeiro: independente de quem ocupe o Palácio do Planalto pelos próximos quatro anos, terá de governar com um Congresso reformista e dominado pelas forças de centro-direita. Assim, para analistas e gestores, as pautas econômicas liberais saem fortalecidas — e o reflexo já pode ser observado nas ações das estatais.
Isso já pode ser visto no pregão desta segunda-feira (3): desde a abertura dos negócios, os papéis das estatais operam em forte alta e sustentam a alta do Ibovespa. Às 14h26, as ações ordinárias da Petrobras (PETR3) subiam 7,62%, cotadas a R$ 35,60. Já PETR4 avançava 7,55% no mesmo horário, a R$ 32,05 — com uma ajuda adicional do preço do barril do petróleo, que subia 3,99%.
Já a Cemig (CMIG4) tinha ganhos de 9,01%, cotada a R$ 11,74, atrás da Copasa (CSMG3), que subia 14,17% a R$ 15,07. Quem também subia forte era a Sabesp (SBSP3), com ganhos de 16,17% e cotada a R$ 57,60.
O Banrisul (BRSR6) também apontava ganhos por volta das 14h55 e subia 3,32%, com as ações cotadas a R$ 12,14.
A busca dos investidores pelas estatais tem a ver não apenas com a expectativa de um governo mais liberal graças ao Congresso e, portanto, menos propenso a intervenções. A agenda de privatizações ganhou força após o resultado das urnas para os governos estaduais, especialmente em São Paulo e Minas Gerais.
Na capital paulista, o candidato aliado de Jair Bolsonaro (PL), o ex-ministro Tarcísio de Freitas (Republicanos), recebeu 42,59% dos votos válidos e vai disputar o segundo turno com Fernando Haddad (PT).
Já em Minas Gerais, o atual governador Romeu Zema (Novo) foi reeleito com 56,18% dos votos e deve apoiar Bolsonaro no segundo turno presidencial mediante determinados apoios na Assembleia Legislativa.
No Rio Grande do Sul, Onyx Lorenzoni (PL) e Eduardo Leite (PSDB) disputam o governo do Estado no segundo turno, ambos defensores de privatizações.
Pegando carona nesse movimento das estatais, o Banco do Brasil (BBAS3) subia 6,23% às 15h08, a R$ 40,92.
"O que move o mercado hoje é esse fortalecimento da direita e de uma agenda liberal, já que influencia diretamente naquelas empresas que corriam mais risco de intervenção de esquerda. O mercado gostou da formação da Câmara dos Deputados e do Senado", diz Marco Noernberg, responsável pela área de renda variável da Manchester Investimentos.
Privatizações à vista?
Para especialistas do mercado, formou-se o cenário perfeito para uma agenda recheada de privatizações de empresas comandas pelos governos estaduais, já que os candidatos citados acima apoiam esse tipo de iniciativa e darão andamento aos processos com relativa facilidade.
Em relatório, o Bradesco BBI aponta que uma possível vitória de Freitas em São Paulo de fato aumenta as probabilidades de privatização da Sabesp.
Os analistas reforçam que o candidato consideraria a ação em caso de redução das tarifas, de olho também no benefício de aceleração dos investimentos com foco na melhoria dos serviços de coleta e tratamento de esgoto.
Nos cálculos da equipe, o processo de privatização da Sabesp ainda pode levar um tempo e seria mais provável a partir de 2024, mas anima o mercado desde já diante do preço baixo do papel.
Na mesma linha, a XP destaca que a bolsa brasileira está com um preço atrativo, o que também justifica a busca por ações com potencial de valorização futura, especialmente diante de uma lista de privatizações.
No mesmo relatório, a XP ainda aponta que o pleito segue aberto para o segundo turno, com o mercado acompanhando de perto as movimentações das próximas semanas, o que pode trazer volatilidade à bolsa.
Além dos papéis citados acima, a XP deixa no radar os setores imobiliário e varejista, mais sensíveis à quedas nas taxas de juros e ligados ao cenário doméstico.
Na avaliação de Matheus Spiess, analista da Empiricus Investimentos, diante do atual nível de preço dos ativos brasileiros, tudo o que o mercado desejava era um gatilho, que já pode estar em evidência agora.
Ele destaca a necessidade de alocação de recursos por parte dos estrangeiros. "Na margem, o europeu, por exemplo, prefere alocar aqui se comparar o Brasil com outros emergentes como a China ou a Índia", afirma. Diante de uma bolsa barata, ele acredita que era esse o empurrão que faltava.
Além das estatais, a corrida presidencial não saiu de cena
Apesar do destaque que as corridas estaduais ganharam no mercado hoje, o pleito presidencial também pareceu mais favorável do que o previsto. Ao conquistar 43% dos votos válidos, Bolsonaro mostrou-se mais resiliente do que as pesquisas indicavam e isso também ajuda as empresas estatais.
Além disso, o atual presidente conseguiu eleger 14 senadores e terá a maior bancada do Senado Federal. Seu partido também terá uma bancada recorde na história da legenda na Câmara, com 99 deputados eleitos.
"É uma composição positiva porque o atual governo ganhou espaço e, mesmo que o Lula ganhe, ele terá dificuldde em tramitir qualquer tema que não agrade o mercado", explica Cássio Bambirra, sócio da One Investimentos.
Parte do mercado faz ressalvas ao comportamento Luiz Inácio Lula da Silva em relação às empresas públicas, por exemplo, temendo algum tipo de intervenção, como tende a ocorrer em governos de esquerda. Ao longo da campanha, Lula reforçou sua visão sobre a função social de instituições financeiras públicas — como o BB e o BNDES — e também criticou a política de preços praticada pela Petrobras.
O petista também deu declarações recentes sobre novos programas voltados ao financiamento do ensino superior, como fez no passado com o ProUni e o FIES.
Nas últimas semanas, empresas do setor educacional vinham surfando essa onda e subiram na expectativa de que, caso eleito, Lula volte a fomentar os mesmos subsídios que garantiram bons lucros para elas nos governos anteriores.
Hoje, Cogna (COGN3/-0,34%), (YDUQS/-3,32%), Ser Educacional (SEER3/-1,57%), Ânima (ANIM3/-0,33%) e Cruzeiro do Sul (CSED3/-4,06%) operam em baixa, algumas delas aliviando as perdas mais acentuadas vistas no início da sessão na B3.