Lá vamos nós de novo. O governo novamente embarcou na tentativa de privatizar (ou desestatizar, como preferir) a Eletrobras.
Na terça-feira (23) à noite, o presidente Jair Bolsonaro e um grupo de ministros foi até o Congresso para entregar o texto da Medida Provisória (MP) que trata da privatização.
O projeto prevê a capitalização da companhia, operação em que ocorre a emissão de novas ações no mercado e a participação do governo na empresa é diluída. A União possui atualmente 51,8% das ações ordinárias da Eletrobras.
Não é a primeira vez que Bolsonaro e sua equipe propõem a privatização da companhia. Isso já havia ocorrido em novembro de 2019, quando o governo enviou um projeto de lei sobre o tema, que acabou não avançando diante da resistência do mundo político.
Nada indica que dessa vez será mais simples. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse ontem que o texto terá análise acelerada. Mas o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), afirmou que os parlamentares farão uma "avaliação crítica" da medida.
A iniciativa foi bem recebida pelo mercado nesta quarta-feira (24). As ações abriram subindo forte, embora tenham perdido força mais para o fim do dia, quando tiveram até mesmo um soluço no campo negativo. Ao fim do pregão, os papéis ordinários (ELET3) fecharam em alta de 3,46%, a R$ 33,80, e os preferenciais (ELET6) subiram 4,94%, a R$ 34.
Mas o que os analistas que acompanham de perto a Eletrobras pensam? Bom, resumindo bem, eles gostam da ideia de a companhia não ter mais influência estatal e calculam que as ações podem mais que dobrar de preço caso a operação ocorra.
Mas como diz o ditado, “gato escaldado tem medo de água fria”, e eles estão em compasso de espera, aguardando os próximos passos.
Detalhes da proposta
O conteúdo da MP foi publicado ontem à noite, em edição extra do Diário Oficial da União.
O texto possibilita o início dos estudos da modelagem da privatização pelo BNDES e inclui algumas modificações no texto do projeto de desestatização. Entre elas estão:
- a inclusão da prorrogação, por 30 anos, da usina hidrelétrica de Tucuruí, controlada pelas Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A (Eletronorte), que atualmente está no regime de produtor independente (e não sob regime de cotas);
- a obrigação de aportes financeiros para revitalização dos recursos hídricos das bacias hidrográficas na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas (R$ 230 milhões em 10 anos), cujos contratos de concessão sejam afetados pela MP, e para redução estrutural de custos de geração de energia na Amazônia Legal (R$ 295 milhões em 10 anos), diretamente pela Eletrobras ou, indiretamente, por meio de sua subsidiária Eletronorte;
- a revitalização dos recursos hídricos da bacia do Rio São Francisco (R$ 3,5 bilhões em 10 anos, que já era previsto no PL);
- nova repartição de receita entre União (por meio do pagamento de bonificação de outorga) e a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), por meio do pagamento de cotas anuais em 30 anos; e
- a previsão de criação de ação preferencial de classe especial, de propriedade exclusiva da União, que dará o poder de veto em deliberações sociais previstas na MP, as chamadas golden shares.
A privatização não atingirá a Eletronuclear, que controla as usinas de Angra 1, 2 e 3, nem a Itaipu Binacional que, por questões constitucionais, devem ficar sob controle da União, sob a gestão de uma nova empresa pública que será criada após a privatização da Eletrobras.
Quanto os acionistas podem ganhar?
Não há dúvidas entre os analistas de que a privatização da Eletrobras, se ocorrer, resultará numa forte valorização das ações.
Para o analista João Pimentel, do BTG Pactual, “evidentemente que há um valor significativo a mais para ser destravado caso uma privatização seja bem sucedida”, calculando que os papéis PNB podem alcançar R$ 75,00 a unidade.
“Nós ainda não mudamos nossas estimativas para a Eletrobras e ainda consideramos em nossos números uma chance de 50% para a privatização, o que se traduz em um preço-alvo de R$ 63,00 para a ELET6”, diz trecho do relatório.
Já os analistas Marcelo Sá e Fernando Zorzi, do Itaú BBA, realizaram os seus cálculos em cima do potencial de alta das ações ordinárias e chegaram à conclusão de que elas podem alcançar R$ 64,00, um potencial de alta de 96% ante o fechamento de ontem, quando já circulava a informação de que o governo enviaria um projeto para privatizar a Eletrobras.
Pedro Manfredini e Flavia Sounis, do Goldman Sachs, não cravaram números, mas estimam que a ELET3 pode atingir um valor entre R$ 58,30 e R$ 91,30 e a ELET6 pode ficar entre R$ 63,80 e R$ 100,20 com uma privatização.
Mas precisa combinar com os políticos
O clima entre os analistas a respeito da possibilidade de a Eletrobras ser privatizada é, como dizem no mercado, de otimismo cauteloso.
Os analistas do Itaú BBA são os mais esperançosos com a possibilidade. “Parece que a privatização tem uma chance maior de ir em frente desta vez, dada a melhora da perspectiva política”, diz trecho do relatório.
Para o BTG Pactual, embora o relançamento do plano de capitalização via MP possa acelerar o processo, ainda há riscos de o prazo do projeto vencer antes de ele ser votado, considerando a resistência vista na tentativa anterior.
O Goldman Sachs também ressaltou a resistência política e destacou ainda a falta de comando na Eletrobras, com a saída de Wilson Ferreira Júnior. “Observamos potenciais desafios para a aprovação da proposta, especialmente uma vez que a companhia ainda não tem um novo CEO indicado”, diz trecho do relatório.
* Com informações da Agência Brasil