A Comissão Especial que avalia a reforma da Previdência na Câmara dos Deputados teve uma sessão monótona com apresentação de plano de trabalho e votação de requerimentos para determinar os convidados das audiências públicas. Mas a coisa deve esquentar amanhã, quarta-feira, com a presença do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a sessão foi encarrada depois de um entrevero entre Guedes e o deputado Zeca Dirceu (PT-PR), que disse que o ministro era “Tigrão” contra aposentados, mas “Tchuthcuca” quando trata com os privilegiados.
O deputado Alexandre Frota (PSL-SP) pediu para que o ministro não fosse xingado e conseguisse falar. Em resposta, o deputado Bira do Pindaré (PSB-MA) falou que o ministro é que tinha faltado com respeito e sugeriu que ele tomasse um suco de maracujá antes da audiência.
Desfile do lobby
A ida de Paulo Guedes e das demais dezenas de convidados é fator determinante para obtenção ou perda de votos para aprovação da reforma?
Indo direto ao ponto, creio que não. A ida do ministro tem sua relevância para defender os pontos do governo e apresentar dados para a população e não para os deputados, que apesar de pedirem um caminhão de informações, muitos querem apenas alguns números para fazer distorções ou discursar para determinados grupos de interesse.
As audiências de públicas são um desfile do lobby a favor e contra qualquer proposta que esteja em discussão. É o natural trabalho dos diferentes grupos de interesse em manter ou conquistar um pedaço do Orçamento público para chamar de seu. A conta? Oras, a conta é da viúva!
Há um sem número de associações, confederações, sindicatos e centrais que desfilarão igualdades, desigualdades justificáveis, diferenças já reconhecidas em lei e muita indignação e defesa do "pobre" e qualquer outra “categoria”.
São as minorias organizadas que tomam conta do Orçamento Público e isso funciona, pois eles têm incentivos para se unirem e atuarem, enquanto a maioria, embora prejudicada, não tem os incentivos para se impor.
Um exemplo. Um grupo de professores, juízes, ou determinado grupo industrial, tem todos os incentivos para se reunir em associações, cobrar de seus membros, financiar políticos, advogados estudos e outros materiais para defender seus interesses.
Enquanto a maioria está dispersa e sem incentivos ou mesmo pensando que “alguém não vai deixar isso acontecer”. A lógica aqui é a dos benefícios concentrados e custos difusos. Algo estudado na economia e na política (referência aqui à Mancur Olson).
O que importa é a política
Assim sendo, os deputados que representam determinado grupo só aprovarão uma reforma da Previdência (ou qualquer outro projeto) desde que ela não represente perda de votos e apoio entre seus representados. Ou que a eventual “maldade” de hoje seja compensada em algum tipo de "benesse" amanhã.
Aqui é que entra o papel da política, da negociação, da barganha, do famigerado “toma lá, dá cá” no difícil trabalho de construir maiorias. Os projetos do Executivo podem até visar um “bem maior”, mas isso não move a política.
De volta à Comissão Especial, os acalorados debates públicos e depois as infindáveis discussões da matéria serão um importante termômetro da capacidade do governo em fazer política.
Quanto mais tempo essas discussões tomarem, menor é o número de votos que o governo tem para levar a matéria ao plenário. O mesmo vale para a desidratação da reforma, ou quanto vai sobrar da ideia inicial de economizar R$ 1,2 trilhão em dez anos.
O relator, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) propôs dez audiências públicas abrangendo diferentes temas ao longo de maio e discussão da matéria em junho. A oposição quer alongar para 15 ou mais audiências, além de fazer eventos nos Estados e convocar uma audiência internacional.
Com isso, foco nos prazos e nas declarações dos deputados e lideranças dos partidos de centro, pois é ali que estão os votos.
A oposição vai fazer seu papel de tentar atrapalhar ao máximo, pois não tem votos. Mas está sempre disponível a se aliar ao mesmo centro, que derrotaria o governo para mostrar sua insatisfação com a política.
É a velha máxima Getulista segundo a qual: se ninguém é tão amigo que não possa virar inimigo, também não existem inimigos que não possam ser convertidos em amigos.
