O mercado internacional continua sofrendo com os efeitos da escalada da guerra comercial, depois que a China resolveu entrar na briga contra os Estados Unidos (leia mais abaixo). Mas as atenções locais se voltam para Brasília, onde a Câmara retoma as discussões sobre a reforma da Previdência, a partir das 13h. A votação deve ser concluída ainda nesta semana.
A ampla margem para aprovação obtida na primeira rodada (379 votos a favor, contra um mínimo necessário de 308), em julho, reduz as chances de surpresas desagradáveis no segundo turno. Ainda mais após a articulação com os líderes partidários. A expectativa é de que o texto passe com folga entre os deputados, sendo, então, encaminhado ao Senado.
Ainda assim, os investidores estarão atentos a eventuais alterações de última hora na proposta a ser aprovada em plenário. O temor é de que haja redução na economia a ser gerada aos cofres públicos, em torno de R$ 900 bilhões em dez anos. O maior risco recai no novo cálculo da pensão por morte, que estabelece corte para 60% do valor recebido.
A oposição tenta retirar do texto essa regra aprovada no primeiro turno, o que traria um impacto fiscal de R$ 130 bilhões a menos no regime geral. Mas o governo quer manter a íntegra da PEC já votada. Já no Senado, espera-se a reinclusão dos estados e municípios no texto, o que pode acontecer durante as sessões nas comissões.
Próximas cenas
A expectativa é de que a questão sobre as novas regras para aposentadoria seja encerrada no Congresso até o mês que vem, abrindo caminho para a discussão de novas pautas, como a reforma tributária e o pacto federativo. Mas ainda não se sabe se as recentes polêmicas envolvendo o presidente Jair Bolsonaro, que reinou sozinho no noticiário durante o recesso parlamentar, irá prejudicar a tramitação da agenda econômica no Legislativo.
Já no front puramente macro, merece atenção a ata da reunião de julho do Comitê de Política (Copom), principal destaque da agenda econômica do dia. O documento será divulgado logo cedo (8h) e pode lançar luz sobre o tamanho do ciclo de cortes na taxa básica de juros, após a queda de 0,50 ponto porcentual na semana passada.
As estimativas situam a Selic entre 5,25% e 4,75% no fim do ano, o que indica queda adicional de até 1,25 pp até dezembro. Mas ainda não se sabe se há espaço para um ajuste dessa magnitude, em meio à piora da cena externa. Com isso, a ata pode vir com validade vencida, caso não esteja atualizada quanto à recente deterioração da guerra comercial.
Já no exterior, o calendário do dia traz como destaque apenas o relatório Jolts sobre as vagas de emprego disponíveis nos EUA (11h). Aliás, a fraca agenda econômica e a ausência de outros drivers deixa o mercado global refém da disputa entre as duas maiores economias do mundo, que entrou em uma nova fase neste mês.
Duelo de gigantes
Depois que a China resolveu responder à ameaça tarifária de Donald Trump, intensificando a guerra comercial com os EUA, os investidores elevaram a preocupação quanto a um conflito prolongado e os impactos na economia global. A retaliação de Pequim ontem levou o Tesouro norte-americano a rotular o país, simbolicamente, como “manipulador de moeda”, pela primeira vez desde 1994, abrindo espaço para novas sanções contra a China.
Trata-se de apenas mais uma carta na mesa na disputa entre os dois países, com os potenciais efeitos desse “selo” sendo apenas uma sombra na guerra já em curso. Relatos na imprensa chinesa dão conta de que o presidente Xi Jinping irá rejeitar qualquer acordo que mantenha tarifas punitivas aos produtos do país ou force Pequim a fazer concessões em questões-chave.
Há também um sentimento crescente de desconfiança por parte da China em Trump, tornando improvável um acordo antes da eleição presidencial nos EUA, em 2020. Afinal, muitos dos eleitores do republicano vem criticando a tarifação contra a China, sendo que a suspensão da compra de produtos agrícolas pode prejudicar Trump em regiões estratégicas para sua reeleição. Trata-se de apenas uma arma que Pequim tem em mãos.
A desvalorização do renminbi era uma das principais respostas já esperadas à tensão comercial e deixar a moeda local se enfraquecer em relação ao dólar, rompendo a barreira dos 7 yuans por dólar pela primeira vez desde 2008, sugere que Pequim não irá se curvar ao “truque” comercial. Assim, a China parece estar se preparando para o pior na guerra, desistindo da postura diplomática branda e abandonando as esperanças de um acordo.
Mercados ensaiam melhora
Em contrapartida, a Casa Branca irá se unir ao Fundo Monetário Internacional (FMI) para eliminar as injustas vantagens competitivas criadas pela China por meio da desvalorização do renminbi. Logo após esse anúncio, ontem à noite, os índices futuros das bolsas de Nova York passaram a apontar perdas de mais de 1%, hora depois de Wall Street amargar a pior sessão do ano.
Nesta manhã, porém, os índices futuros passaram a ensaiar ganhos, em uma tentativa de recuperação das fortes perdas da véspera. Na Ásia, as principais bolsas da região também reduziram as quedas mais acentuadas registradas durante a sessão e fecharam com perdas moderadas. Xangai liderou o movimento, com -1,6%. As bolsas europeias também tentam se firmar no campo positivo, após uma abertura no vermelho. Já o petróleo avança.
O movimento de melhora nos mercados reflete, em parte, a decisão do Banco Central chinês (PBoC) de fixar uma taxa de referência do yuan mais alta que o esperado, um dia após a autoridade monetária ter permitido um valor acima de 6,90 pela primeira vez desde dezembro. Nas negociações offshore, o dólar valia 7,0562 yuans. A moeda norte-americana, aliás, tenta recuperar terreno em relação aos rivais.
Esse movimento no exterior pode aliviar a pressão no mercado doméstico, um dia após o Ibovespa atingir o menor nível desde o fim de junho, perdendo momentaneamente a marca dos 100 mil pontos. O mesmo alívio deve ser visto nos negócios com dólar, que encerrou a sessão de ontem acima de R$ 3,95, no maior valor desde o fim de maio, respingando nos juros futuros. Hoje, deve haver um pullback. A conferir.