Quando questionado sobre seu estilo de gestão, Alexandre Silverio, executivo-chefe de investimentos da AZ Quest, costuma brincar e responder que é um “velho investor” – uma referência ao “value investing” do bilionário Warren Buffett.
Com uma longa estrada no mercado (mas longe de ser velho), Silverio é responsável pela gestão de R$ 19 bilhões em fundos da gestora fundada pelo ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros e que teve o controle vendido em 2015 para a italiana Azimut.
Estive na sede da AZ Quest na quarta-feira para saber qual a visão do experiente gestor sobre a queda recente da bolsa e a disparada do dólar para além do patamar de R$ 4,15. Voltamos a conversar rapidamente ontem por telefone para falar também sobre o resultado do PIB melhor que o esperado no segundo trimestre.
Mesmo com a recuperação desta quinta-feira, o Ibovespa ainda acumula uma baixa de 5% desde a máxima histórica alcançada no dia 10 de julho. Afinal, o ciclo de alta da bolsa está ameaçado?
Para Silverio, houve de fato uma piora recente no cenário externo em razão do acirramento da guerra comercial entre Estados Unidos e China. Trata-se de um risco que precisa ser acompanhado de perto, mas que até agora não mudou as perspectivas favoráveis para a economia brasileira e, principalmente, as empresas listadas na B3.
"A bolsa segue como a nossa principal aposta", afirmou o gestor da AZ Quest, que considera a queda das últimas semanas como uma oportunidade de compra para quem ainda não tem exposição em renda variável.
Essa posição é baseada em duas principais frentes: a perspectiva de retomada da atividade econômica com a agenda de reformas e o novo ciclo de queda de juros, que deve incentivar a migração de recursos que hoje estão na renda fixa.
"Síndrome de ansiedade"
Isso não significa que as ações vão disparar e a economia vai voltar a apresentar altas taxas de crescimento da noite para o dia. Aliás, o investidor de bolsa vem sofrendo do que Silverio chama de "síndrome de ansiedade".
Essa síndrome tem relação com a série de cenários binários que o país enfrenta desde 2016. Primeiro com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, depois com o risco de queda de Michel Temer e no ano passado com o processo eleitoral.
Ao longo do primeiro semestre, o mercado conviveu com outro evento binário: a aprovação ou não da reforma da Previdência. A expectativa era que cada um desses episódios fosse o gatilho para uma retomada da confiança e uma recuperação mais efetiva da economia, o que acabou não acontecendo.
Junto com a ansiedade do investidor local, o noticiário negativo relacionado ao Brasil – agravado nas últimas semanas com as queimadas na Amazônia – em nada contribui para atrair o estrangeiro, segundo o executivo da AZ Quest.
Alívio com PIB
Nesse contexto, a divulgação do resultado do PIB no segundo trimestre ajuda a melhorar o clima, o que explica parte da forte alta de 2,37% da bolsa ontem, segundo Silverio.
Para o gestor, além do crescimento da economia acima do esperado, os números trouxeram melhora em setores importantes. "Cadeias com ciclo longo, como a de construção civil, mostraram que estão vivas e começaram a reagir."
Apesar da surpresa positiva vir em boa hora, a AZ Quest não mudou a expectativa de expansão de 0,8% para a economia neste ano e de 2,5% para 2020.
Ajustes na carteira
A melhora no cenário externo também ajudou a puxar a bolsa no pregão de ontem, ainda que não haja uma indicação clara de que a guerra comercial esteja perto do fim.
O aumento na escalada das tensões entre Estados Unidos e China que chacoalhou os mercados nas últimas semanas levou a AZ Quest a fazer alguns "ajustes finos" na carteira, segundo Silverio.
Na bolsa, a preferência pelas empresas ligadas ao mercado doméstico continua. Mas a gestora aproveitou a queda das ações das produtoras de commodities para aumentar a exposição.
Já nos fundos multimercados, houve uma pequena redução em posições aplicadas na curva de juros. "O cenário deu uma piorada e a moeda andou, então era natural fazer algum ajuste", disse.
Sobre o câmbio, Silverio disse que tem evitado uma maior exposição nos fundos, com exceção de posições específicas para captar alguns exageros no mercado.
Mapa de riscos
E o que faria o "velho investor" mudar de posição em relação às boas perspectivas para o mercado de ações?
Para Silverio, o ciclo de alta da bolsa pode ser ameaçado no caso de uma escalada da guerra comercial que leve a uma freada brusca na economia global.
Por aqui, a síndrome de ansiedade também pode atrapalhar se as medidas da agenda liberal da equipe econômica demorarem muito a se traduzir em retomada da economia.
"O grande risco para a bolsa é que essa ansiedade vire desilusão", afirmou.